“Rei da soja”, Blairo Maggi apoia o PL 191 e quer sociedade com empresa canadense que tem mina de potássio no Amazonas

A Potássio do Brasil, controlada pelo grupo canadense Forbes & Manhattan, pode ganhar um sócio de peso para a controversa mina de potássio em Autazes, a 113 quilômetros de Manaus, no Amazonas: o “rei da soja” Blairo Maggi.

O ex-ministro da Agricultura do governo Temer é o principal nome por trás da Amaggi, empresa familiar e gigante do agronegócio brasileira que atua no cultivo, comercialização e logística de grãos, especialmente soja.

A mina em Autazes, descoberta em 2010 e de propriedade da empresa canadense, acumula questionamentos na justiça, ações do Ministério Público Federal e patina para realizar a consulta prévia aos indígenas do povo Mura, afetados pelo projeto.

O Brasil, que importa 96% do potássio utilizado sobretudo no agronegócio – e o insumo vem principalmente da Rússia – quer há muito tempo expandir a exploração de fertilizantes.

O assunto está nos holofotes diante das declarações recentes de Jair Bolsonaro, que usa a guerra na Ucrânia para forçar a aprovação do PL 191/2020, contra a avaliação técnica do próprio governo.

O PL visa autorizar justamente a mineração e o agronegócio em terras indígenas.

Na última sexta (11), Bolsonaro lançou o Plano Nacional de Fertilizantes. Embora esta seja uma articulação antiga do governo e que quase 90% das reservas conhecidas de fertilizantes na Amazônia estejam fora de terras indígenas, o pretexto da guerra é apenas o último de uma longa lista de chantagens econômicas que a cúpula do governo costuma fazer.

Nada disso parece empecilho para Blairo Maggi, que também é ex-governador do Mato Grosso e ex-senador pelo mesmo estado.

Amaggi deve entrar na logística de transporte do potássio

Maggi, dono da maior trader de grãos do Brasil, anunciou que está negociando com Stan Bharti, o homem por trás da Forbes & Manhattan, para o “desenvolvimento” do que pode ser a maior mina de potássio da América Latina, com 800 milhões de toneladas estimadas. O investimento previsto é de US$ 2,5 bilhões.

A Amaggi entraria principalmente com a logística do negócio, oferecendo transporte pelas hidrovias que possui nos rios da região – Autazes fica entre os rios Madeira e Amazonas – via o braço de navegação do grupo, a Hermasa Navegação.

“Esse projeto é bastante importante para o Brasil, principalmente pela sua posição geográfica. A logística é extremamente importante na questão do potássio. Ele consegue chegar nas mais distantes regiões através das hidrovias que nós temos, a Mato Grosso, Goiás, Tocantins ou Maranhão, e também para o Sul do Brasil com cabotagem em navios”, disse Blairo Maggi.

Procurada para comentar as tratativas em curso, a Potássio do Brasil disse que está negociando “com várias partes”, mas que não irá comentar detalhes no momento. A Amaggi confirmou que está “avaliando” a possibilidade de entrar no negócio, mas que, por enquanto, “não há um objetivo vinculante” e as empresas não iriam fornecer mais informações “em função de obrigações de confidencialidade por elas assumidas”.

Sobre o Plano Nacional de Fertilizantes lançado por Bolsonaro, a Potássio do Brasil ressaltou que trata-se de “um plano de Estado” e disse que o projeto “mostra uma união de vários ministérios” trabalhando para reduzir a dependência brasileira da importação de fertilizantes para o agronegócio.

O mercado especula que Blairo Maggi pode ajudar também com o “andamento burocrático” do projeto de Autazes. O faturamento estimado da Amaggi para 2021 ficou em R$ 44 bilhões.

Sobre o PL 191, Maggi declarou há pouco que “nesse momento é o seguinte: existe falta de produto, os ambientalistas não querem, então se polarizou uma situação. O meu entendimento é que o subsolo pertence à nação brasileira, não pertence a nenhum de nós, nem aos índios, então explorar essas riquezas, se com responsabilidade e com todo o cuidado, gera riquezas para a nação brasileira e vai gerar royalties para quem está nas nossas áreas. Com cuidado, dá para fazer”, afirmou.

Complexo da Amaggi em Porto Velho (RO), onde estão em andamento obras de uma das novas fábricas misturadoras de fertilizantes da empresa

Potássio do Brasil iniciou exploração sem consulta prévia

A mina em Autazes está projetada para produzir inicialmente 2,4 milhões de toneladas por ano quando for construída. Isso, no entanto, levaria três anos após a obtenção das licenças. A Potássio do Brasil também pretende desenvolver uma mina rio abaixo em Itapiranga, que acrescentaria mais 2 milhões de toneladas por ano de capacidade de potássio.

Antes mesmo de consultar os indígenas Mura por ordem de um Tribunal Federal, no entanto, a Forbes & Manhattan avançou em 2020 e assinou um acordo com a CITIC Construction, empresa chinesa, para construir a mina em Autazes por US$ 1,9 bilhão de dólares.

O projeto contempla a implantação de dois poços, cada um com 7 ou 8 metros de diâmetro, uma mina subterrânea localizada a cerca de 800 metros de profundidade, uma planta de concentração de potássio, a reforma de uma estrada de 12 km de extensão, um porto no rio Madeira e uma linha de transmissão de energia, a partir do linhão Tucuruí–Manaus, com aproximadamente 130 km de extensão.

O local onde se planeja instalar a mineradora fica a 10 km de distância da Terra Indígena Paracuhuba, demarcada e homologada, e a 8 km da TI Jauary, já delimitada. Está próximo também de outras duas comunidades indígenas ainda não demarcadas, mas com solicitações já encaminhadas à Funai: Urucurituba, a 8 km, e Soares, a apenas 2 km de distância.

A Potássio do Brasil iniciou as atividades de prospecção dentro da TI Jauary em 2013, período em que a área já estava delimitada, e perfurou um cemitério sagrado para a comunidade, revela matéria da Mongabay, parceira do Observatório da Mineração de 2020.

Os promotores que recomendaram pela primeira vez em 2016 que a licença da mina fosse cancelada até que o povo Mura fosse consultada disseram que as explorações de potássio estão acontecendo há anos sem o seu consentimento, uma violação da Constituição.

Com esse longo histórico de conflitos e acusações de cooptação de lideranças indígenas, a Potássio do Brasil se limitou a dizer, após pedido de posicionamento feito por mim, que a consulta está sendo conduzida pelo povo Mura, obedecendo ao protocolo por eles definido.

“Para nós a terra é sagrada, as florestas e os rios também. Não queremos correr o risco de que nada aconteça”, disse Fabio Gama, uma liderança dos Mura, em vídeo nas redes sociais. “Este não é um bom negócio para o nosso povo.”

O grupo Forbes & Manhattan é dono também da Belo Sun, que tenta há anos abrir um mega projeto de ouro no Pará, novamente acumulando ações na justiça e conflitos com indígenas.

Ambas as empresas – Belo Sun e Potássio do Brasil – estão listadas em relatório recente do Observatório da Mineração com a Amazon Watch e a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) como uma das empresas que receberam investimentos significativos para os seus projetos problemáticos na Amazônia.

Na terça (15 de março), os executivos da Potássio do Brasil se encontraram com a atual ministra da Agricultura, Tereza Cristina, no Canadá, e anunciaram a intenção de dobrar a capacidade de produção na mina de Autazes para 5 milhões de toneladas por ano, isso cobriria quase metade da necessidade brasileira de potássio.

Atualização em 17 de março

A declaração de Blairo Maggi destacada no texto sobre o PL 191/2020 foi dada em entrevista esta semana, divulgada pelo site Olhar Direto, do Mato Grosso.

Maggi foi questionado sobre diversos assuntos, incluindo mineração em terras indígenas. Confira o áudio da entrevista abaixo.

Aos 10 minutos, os repórteres perguntam: “Qual a sua opinião sobre esse projeto de lei para liberar mineração em terras indígenas justamente por conta do potássio? Acha que isso pode resolver, vai ajudar?”

Resposta de Blairo Maggi:

“Olha, a Constituição brasileira permite esse tipo de coisa. Tá previsto que poderá ser feito, precisa de uma lei para regulamentar, o que tá se tentando fazer. Por muito tempo se tentou fazer isso também e não se conseguiu.

Eu não gosto muito quando as coisas ficam politizadas. Nesse momento é o seguinte: existe falta de produto, os ambientalistas não querem, então se polarizou uma discussão que não deveria sê-la.

O meu entendimento é que o subsolo pertence à nação brasileira, não pertence a nenhum de nós, portanto nem aos índios, então explorar essas riquezas, se com responsabilidade e com todo o cuidado gera riquezas para a nação brasileira e vai gerar royalties, vai gerar coisas para quem está de domínio nessas áreas. Com cuidado, dá para fazer”.

Em nota enviada para o Observatório, a assessoria de Blairo Maggi negou que o ex-ministro da Agricultura tenha defendido o PL 191 e a exploração mineral em terras indígenas.

Segue a nota na íntegra.

PL 191: “Não defendo a exploração e sim, um Plano de Governo”, diz Maggi

De forma equivocada alguns veículos de comunicação têm divulgado que o ex-ministro da Agricultura, empresário Blairo Maggi teria defendido a exploração de minérios em terras indígenas. Em verdade, a manifestação foi pela criação de um Plano Emergencial de Governo, a fim de garantir a produção nacional de fertilizantes uma vez que, além do Brasil importar 70% desses produtos, sendo que, 30% desse total vem da Rússia.

“Estamos falando de uma realidade de mercado preocupante e que exige um planejamento de Governo. O que eu defendo é a criação de um Plano Nacional Emergencial para aumentar a produção dos insumos e diminuir a dependência externa”, disse.

Blairo ressalta ainda que esse é um debate que acontecerá na esfera técnica, ambiental, social e política.

“Hoje, não temos uma legislação que seja adequada para esse fim, então, é necessário partir do princípio e respeitar os ritos de audiência pública, realização de estudos técnicos, oitiva junto às comunidades indígenas, participação de toda a sociedade civil organizada e órgãos ambientais. Qualquer coisa diferente disso é temerário”, declarou Maggi.

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