Salvaguardas para a expansão do lítio na América Latina e no mundo são discutidas em evento em Berlim

A convite da Brot für die Welt e da Fundação Heinrich Böll, instituições alemãs que são destaque nas discussões sobre transição energética e minerais críticos, eu participei, como diretor executivo do Observatório da Mineração, do evento “Lithium Week” organizado na primeira quinzena de maio em Berlim.

O workshop reuniu organizações da América Latina, Europa e África para debater o contexto do lítio em cada região a partir da perspectiva dos direitos humanos e do meio ambiente, trocar experiências e pensar caminhos e alternativas.

Participaram, além do Observatório e das duas instituições já citadas, a CEDIB (Bolívia), Center For Environment (Bósnia e Herzegovina), ClientEarth (Alemanha), CNRG (Zimbábue), CPE (Sérvia), Engenera (México), FARN (Argentina), Federação Internacional de Direitos Humanos (França), FIMA (Chile), Polecol (Sérvia), RERI (Sérvia) e SOMO (Holanda).

Levei para os quatro dias do encontro, incluindo reuniões privadas e um evento público com a participação de pesquisadores, políticos, ativistas e estudantes, a realidade sobre a expansão do lítio no Brasil, que está concentrado no Vale do Jequitinhonha em Minas Gerais.

Detalhei como as empresas que exploram lítio em Minas Gerais tem tentado se apresentar como empreendimentos “verdes” e “sustentáveis” quando na verdade consomem grande quantidade de recursos como água em uma região de histórica escassez hídrica, produzem montanhas de rejeitos e, de acordo com os relatos de lideranças locais, indígenas, quilombolas e pesquisadores, são responsáveis por diversos impactos socioambientais, inflação em alta e sobrecarga no sistema de saúde das cidades.

Roda de debate do evento público “Deregulation and access to raw materials at any price – the answer to current crises? Debate with lithium experts from Latin America, Africa and Europe” realizado na sede da Brot für die Welt em Berlim

Destaquei as matérias que produzimos desde 2023 sobre o lítio no Vale do Jequitinhonha, a nota técnica que acabamos de publicar sobre o “PL do Lítio Verde” aprovado na Câmara que agora está sob análise do Senado e o também recém-publicado relatório “Riscos Climáticos Cumulativos Para Minerais de Transição no Brasil”.

A perseguição judicial que estamos sofrendo por parte da Sigma Lithium foi levada para o público internacional. A intimidação e tentativa de censura da mineradora está sendo investigada por Ministério Público Federal, Ministério Público de Minas Gerais, Defensoria Pública da União, recebeu repúdio de associações de jornalismo (Abraji, Fenaj, SJDF) e de pesquisa (ABA e dezenas e outros). A FIDH publicou em português e inglês uma nota em defesa do Observatório da Mineração e solicitou medidas aos órgãos responsáveis da ONU e às autoridades brasileiras.

Ao longo de toda a semana de debates em Berlim tivemos a oportunidade de conhecer de maneira aprofundada o contexto da extração de lítio e de minerais críticos de cada país presente e da União Europeia, discutimos leis, cadeias de valor, sistemas de certificação, estudos e possibilidades de incidência e colaboração.

“Discussões estratégicas como as que tivemos são ainda mais necessárias em tempos em que, diante das crescentes tensões geopolíticas, os Estados estão cada vez mais focados em sua própria segurança de suprimento dos chamados “minerais críticos” e esses minerais estão se tornando cada vez mais instrumentos de poder. E isso enquanto os direitos humanos, os critérios sociais e ambientais, bem como as discussões sobre suficiência, estão sendo cada vez mais relegados a segundo plano e o progresso regulatório alcançado ameaça ser revertido”, analisa Kristina Stier, consultora de políticas de matérias-primas e comércio justo no Departamento de Economia e Sustentabilidade da Brot für die Welt, organizadora do evento.

Para Stier, a reunião de tantos especialistas de 11 países diferentes em Berlim foi uma oportunidade para desenvolver discussões estratégicas sobre os contextos locais e encarar questões como a promessa de criação de valor para os países ricos em matérias-primas, o papel questionável dos padrões e esquemas de certificação da indústria, entender melhor diferentes leis e regulamentações e articular instâncias de participação em processos internacionais sobre minerais críticos, como os liderados pela ONU.

“O evento foi uma base para intervir com uma voz comum mais forte e para desenvolver e reforçar novas estratégias e narrativas. Quero expressar um caloroso agradecimento a todos os envolvidos neste processo”, complementa Stier.

“Para mim, foi ótimo ver diferentes estratégias e muitas maneiras criativas de reivindicar direitos e se opor à narrativa e ao poder das corporações de mineração e dos governos, que estão mais interessados ​​em acomodar as mineradoras do que atender aos seus próprios cidadãos. Ao mesmo tempo, é chocante ver tanta desregulamentação e um ambiente cada vez mais difícil para a sociedade civil agir. Foi muito enriquecedor trocar e ouvir histórias sobre o lítio ao redor do mundo”, comenta Johanna Sydow, que lidera a Divisão de Política Ambiental Internacional da Fundação Heinrich Böll.

Enquanto diretor do Observatório, agradeço o convite das organizações responsáveis pelo evento, celebro todas as trocas de experiências feitas durante a semana na Alemanha, a oportunidade de levar o contexto brasileiro de lítio e minerais críticos para uma audiência tão qualificada e atenta e reforço que o Observatório da Mineração continuará a colaborar e atuar em parceria com diferentes organizações ao redor do mundo, parte central da nossa estratégia.

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