Frustração da COP 29 aumenta a temperatura para Belém em 2025, que deverá ser a “COP da mineração”

ANÁLISE

A aprovação de US$ 300 bilhões por ano até 2035 para financiar a ação climática nos países em desenvolvimento foi considerado um retumbante fracasso por significativa parcela dos participantes da COP 29 de Baku, no Azerbaijão.

Esta era o principal objetivo do evento marcado pela geopolítica de combustíveis fósseis, uma tônica das três últimas COP’s: definir quem iria pagar a conta e como. O valor aprovado representa uma parcela dos US$ 1,3 trilhões reivindicados, quase cinco vezes menos, portanto, e cerca de meros US$ 6,6 bilhões por ano para cada um dos 45 países mais vulneráveis à crise climática.

E os países ricos, que já aplicaram calote nos US$ 100 bilhões anuais que estavam firmados até este ano de acordo com a maioria das estimativas, insistiram em dividir a fatura com o Sul Global, sem sucesso até o momento. Além da fragilidade da proposta aprovada e do saldão em relação à pedida original, não existe nenhuma garantia de que esse dinheiro irá realmente chegar para quem precisa.

No sentido oposto do que deveria discutir, afinal, a COP 29 teve 1.773 representantes do lobby fóssil, número que superou as delegações dos países mais afetados pela crise do clima, o Azerbaijão utilizou o evento para fechar novos negócios de óleo e gás e cerca de 132 executivos do setor tiveram o tapete vermelho estendido para participar da conferência.

O financiamento aprovado em Baku foi considerado “um insulto” e uma “flagrante violação da justiça climática” pelos países em desenvolvimento, como destacou o Observatório do Clima. Pior, destaca o texto da organização que reúne centenas de ONG’s ambientalistas: “o texto não coloca os países desenvolvidos como responsáveis (mas sim “na dianteira” dos esforços), não determina que esse financiamento deve ser público (o que pode diluir as fontes e responsabilidades) e abre espaço para que parte do aporte seja feito através de mecanismos de empréstimo (o que é visto como risco de endividamento pelos países em desenvolvimento)”, resumiram.

A análise do Observatório do Clima, que fala em “subversão de qualquer conceito de justiça”, “zombaria”, “passo para trás” e “desastre” é acompanhada por outras entidades que também consideraram o resultado da COP 29 bem ruim.

Foto de destaque:  Vugar Ibadov/ONU

COP no Brasil deverá ser a “COP da mineração”

Tudo isso certamente adiciona mais pressão à COP que será realizada em Belém do Pará em 2025. Carregar o fracasso da COP 29 para resolver o impasse do financiamento era um peso que os negociadores não precisavam, já às voltas com a tarefa nada simples de alinhar as metas de cada país – chamadas de NDC’s no jargão climático – que devem ser mais ambiciosas para que o objetivo de conter o aquecimento a 1,5º grau até o fim do século não seja definitivamente enterrado.

A meta firmada no Acordo de Paris, que completará 10 anos em 2025, soa cada vez mais distante e os objetivos de triplicar as energias renováveis, duplicar a eficiência energética e fazer a transição para o fim dos combustíveis fósseis patinam ao sabor dos interesses dos lobistas e de países pouco dispostos a pagar a conta e fazer a sua parte.

Todos esses objetivos dependem de um elemento central: mineração. Os chamados “minerais críticos” – “estratégicos ou de transição” – são cruciais para as energias renováveis. Sem eles, não existe transição energética.

Essa centralidade é explorada, claro, pela indústria mineral, que intensificou a sua participação nas últimas COP’s – e Baku não foi exceção – já mirando o que virá na Conferência de Belém.

Como maior estado minerador do Brasil ao lado de Minas Gerais, lar da maior mina de minério de ferro a céu aberto do mundo e um dos principais complexos do planeta – Carajás – sediando grandes projetos de empresas chave no cenário global como Vale, Hydro, Mineração Rio do Norte (Glencore), Alcoa e várias outras, a COP 30 deverá ser a COP da Mineração.

Por acontecer no Brasil, no Pará, pela mobilização que a indústria mineral está promovendo visando o evento, pelo fato de que, mesmo que vários outros problemas da geopolítica da crise climática não tenham sido resolvidos e a questão da expansão mineral necessária para garantir a transição energética ainda seja alvo de debate incipiente nas COP’s, o Brasil será o cenário perfeito para isso mudar.

O Banco Mundial estima que três bilhões de toneladas de minerais estratégicos serão necessários para expandir as fontes de energia limpa como solar, eólica e geotérmica. Um estudo da Agência Internacional de Energia indica que as cadeias globais de suprimentos de baterias e minerais precisam se expandir dez vezes para atender à demanda projetada até 2030.

Foto: Kiara Worth/ONU

Além disso, de acordo com a ONU, a extração global de matérias-primas deve aumentar em 60% até 2060, levando a sérias consequências para o clima e o meio ambiente, conforme destacado no estudo Global Resource Outlook deste ano. Esta análise alerta que tal crescimento pode comprometer os esforços para atingir não apenas as metas globais de clima, biodiversidade e redução da poluição, mas também a prosperidade econômica e o bem-estar humano.

Enquanto as negociações na COP seguem descoladas do mundo real, devemos bater pelo segundo ano seguido o recorde de ano mais quente já registrado na história humana e, desde o Acordo de Paris, a concentração de carbono na atmosfera também tem atingido recordes seguidos.

Relatório do painel para minerais de transição criado pela ONU, lançado em setembro, afirma por exemplo que “os direitos humanos devem estar no centro de toda a cadeia de valor da mineração” e que é preciso uma “estrutura global de rastreabilidade, transparência e responsabilidade”, algo ainda distante.

O Brasil será o momento para que os minerais críticos passem a ocupar o protagonismo necessário com uma discussão, espera-se, plural e de alto nível, não totalmente cooptada pela indústria, lobistas e os suspeitos de sempre.

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